segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Em seu conto "A Ilha Desconhecida", José Saramago faz um tratado filosófico muito descontraído acerca das coisas que se conhece, das que se pretende conhecer, das que são desconhecidas e das que são passíveis de conhecimento. Logo nas primeiras páginas debate-se o personagem principal com o rei, e este, dando-lhe resposta, como que se livrando do homem, dá-lhe um cartão de visita, "onde, debaixo do nome do Rei, lê-se: Rei".
Interessante como tantas vezes o sujeito se define por seu cartão! Toma-se então a coisa pela representação da coisa, ao invés da coisa em si -- lembrando, aliás, que rei tem em sua origem o vocábulo "res", isto é, a "coisa".
Aliás, mais interessante, ainda, a estrutura burocrática do reino -- a porta das petições, a porta dos obséquios e a porta das decisões são três importantes lugares pelos quais temos acesso à percepção de uma organização política que remonta as últimas descobertas ao tempo das caravelas (pela visão de Saramago, não a minha).
Excelente leitura, que deve, aliás, ser lida várias vezes, para perceber a simplicidade e profundidade da reflexão em inegavelmente talentoso escritor.
Por isso é o primeiro a constar na lista de Literatura que hoje começo a atualizar.
Recomendo para todas as idades -- pois para todas terá, com certeza, uma bela mensagem a entregar.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

O Visitante

Em meu trabalho sou extremamente afortunado.

Todos os dias, um passarinho, cuja raça não consegui identificar ainda -- e ele não me deixa fotografar: foge sempre que tento pegar a câmera -- pousa à minha janela e assovia. Duas, três vezes.

Fica a, talvez, um metro de distância de mim. Olha, com seus pequenos olhinhos, dá uma chacoalhada nas penas, assobia; às vezes insiste.

Depois, vai embora.

Certamente mora por perto.

Tento imitá-lo, como a chamá-lo de volta; quando ele está de bom humor, atende ao chamado. Mas nada de me deixar fotografá-lo.

Tem talvez o tamanho de um canário; pouco maior. Penas cinza-azuladas; mais azuis, de um azul-claro, nas asas e próximo às laterais do abdômen; cinzentas no restante, claras; o peito é talvez de um cinza mais claro ainda, e a cabecinha tem um tom um pouco mais escuro que não chega ao chumbo.

Presenteia-me e não me deixa esquecer que existem coisas que não precisam de explicação, mas convidam à apreciação pura e simples de uma beleza que não exige nada em troca além da admiração em si mesma.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Das Profundezas


Esta manhã ao acordar, mais uma vez tive o prazer de olhar pela minha janela e ver muito verde. Do meu quarto, olho para um lugar cheio de árvores, com um verde profundo, tropical, úmido, do sul do Brasil, onde há muitas árvores da Mata Atlântica que despejam abundantemente suas folhas pela relva, o ano inteiro.

Esta característica está presente na minha vida de maneira marcante: na casa onde moro a maior parte do ano, na Região Metropolitana de Curitiba, próximo à Serra do Mar (pelo lado de cima); e na casa de praia, cujos fundos olham para as montanhas da Serra do Mar, pelo lado de baixo, de onde posso ver também densa vegetação, pela janela, verde e flores das espécies da Mata Atlântica no lado mais quente do litoral paranaense.

Quando olho para esta imensidão de verde, imediatamente me vêm idéias sobre a pequenez do ser humano e a imensidão das coisas da Criação, e ao mesmo tempo em que reflito sobre a vastidão da minha ignorância, também penso nas profundezas da psique.

Quando então vêm a mim os pensamentos sobre as descobertas psíquicas, das quais mal chegamos nas margens do oceano enorme que permeia o saber sobre si, surgem imagens do que, na medida do possível, se relaciona ao mais distante que pode ser visto -- que aliás é tão pouco.

Essa imagem abaixo, dos anéis de Saturno, tirada há poucos dias pela Sonda Cassini em órbita de Saturno e seus satélites a alguns bilhões de quilômetros de distância da Terra, é uma alegoria um tanto fraca do que me ocorre quando, abismado, olho para o verde, penso na minha pequenez e me sinto -- nesse aspecto, na infinitesimal pequenez -- parte da humanidade.